Terça-feira, 26 de maio de 2009
por Lucas Toyama Aos 14 anos de idade, Marcelo Saiola era uma celebridade e estampava as capas de jornais e revistas. Após entrar para o Guinness Book como o tenista mais jovem do mundo a figurar no ranking da ATP, ele gozava da fama, era visto por patrocinadores como um pote de ouro e transmitia a certeza do futuro promissor de uma carreira que havia começado aos cinco anos de idade. Nada disso se concretizou. O anúncio da aposentadoria precoce – como tudo em sua vida até então – chocou o País. Adolescente, quis deixar as quadras para ser um garoto normal. Não estava feliz. Perdera o gosto pelo esporte. Saiola sucumbiu à pressão. "Não sentia mais prazer. O tênis deixou de me satisfazer na medida em que a cobrança por resultado por parte da família, patrocinadores e por todos aqueles que me rodeavam começou a aumentar", diz. "Só existia o Marcelo tenista, que dava resultado e dinheiro, e não mais uma pessoa jovem que queria ir a festas e ter uma vida comum", lamenta. Hoje, ele é professor de tênis e usa sua experiência para ajudar a quem precisa. Dá palestras a executivos e, por meio de sua história, alerta para uma realidade recorrente no mundo organizacional: o limite tênue que transforma a pressão de motivador a um problema que conduz à inação e ao fracasso. Com o dinamismo dos mercados e o acirramento da competição, a tendência natural foi o aumento por cobranças e resultados. Esse incremento, quando exagerado, vem acompanhado de executivos infelizes, angustiados e pouco produtivos. "A pressão é importante para o crescimento do ser humano; é necessária para tirá-lo da zona de conforto e evitar a lei do mínimo esforço", defende Marlene Ortega, diretora da Universo Qualidade Gestão e Conhecimento, entidade voltada para educação corporativa. "Portanto, não se trata de um problema, desde que em doses coerentes", complementa.
E como essa "medida certa" pressupõe boa parcela de subjetividade por parte tanto de quem pressiona quanto de quem é pressionado, não há outra saída a não ser recorrer ao bom senso. "Os líderes devem ter a sensibilidade de conhecer individualmente seus comandados para saber cobrar a tarefa certa do colaborador responsável e, também, para ter consciência do ponto até o qual ele pode chegar com sua pressão", explica a consultora.
Tarefa difícil essa, sem dúvida. Sobretudo porque os próprios líderes recebem doses cavalares de pressão que vem lá de cima. Cria-se, assim, uma "cultura da pressão" que, ao invés de contribuir para o crescimento coletivo, mina relações, torna o ambiente pesado, e pode até paralisar e posicionar a companhia num estado de fracasso iminente. O diálogo é sempre aconselhável como forma de minimizar o trauma. "É importante, no entanto, que os colaboradores procurem pessoas de fora de seu ambiente de trabalho, que possibilitem uma visão externa dos acontecimentos", afirma Marlene. "Falar com colegas de trabalho pode apenas alimentar um ciclo de desgastes, tornando o processo todo improdutivo", completa. Trocar impressão com a liderança para tentar acertar o ponteiro direto com a fonte também é saudável. "Os líderes têm que ter a capacidade de sempre utilizar a pressão de maneira positiva, como forma de desafiar e instigar seus funcionários", finaliza.
Pressão e aprendizado
Foi exatamente isso que aconteceu com Nelson Savioli, atual superintendente executivo da Fundação Roberto Marinho. Em 1991, quando era gerente geral de Recursos Humanos da Rhodia, ele não se entregou à pressão e transformou um aparente fracasso num caso de sucesso. Isso só foi possível porque durante todo o processo ele teve respaldo de seus superiores, que deram a ele um voto de confiança.
Pressionado, iniciou imediatamente um processo de averiguação. Queria entender o porquê de tanta gente querer se desligar da companhia. Estressado, não entrou em colapso por ter tido o apoio de seus superiores, que lhe deram suporte o tempo todo. Entrevistou diversos demissionários e descobriu que, na verdade, eles se sentiam gratos à empresa, apostavam na empregabilidade conquistada com os aprendizados lá adquiridos e queriam alçar voo solo. Outros desejavam simplesmente retornar à terra natal e aproveitariam a indenização para concretizar esse sonho. Nas palavras de Savioli, a força da Rhodia tinha imposto essa aparente "derrota". "Passei por momentos complicados, de alta tensão, mas em momento algum foi algo desumano. Sentir pressão é natural, desde que ela não seja injusta e desmedida", recorda.
A experiência de Savioli o levou a compartilhar seus aprendizados no livro "Fracassos em RH -- E Como se Transformaram em Casos de Sucesso" (Editora Qualitymark). O autor defende que o sucesso na carreira é impossível sem períodos de pressão. "Pressão é neutra. Pode influenciar sucessos e fracassos, dependendo do grau e de como é exercida", diz. E no caso de o fracasso acontecer, é preciso estar atento para, primeiro, revertê-lo e, depois, tirar lições dele. Palavras de quem esteve presente nos picos e nos vales do mundo corporativo. Como se não bastassem todos à volta exigindo que você seja o melhor, o mais produtivo, o mais bem sucedido, pleno e sereno, existe, ainda, aquela voz que vem de dentro, cujo discurso é justamente o de que você precisa suprir todas essas expectativas. Num mundo que tem pressa não há tempo para aprendizados. Torna-se um ponto fora da curva, portanto, quem consegue parar e respirar, reerguer-se da queda, administrar a ansiedade, olhar um horizonte mais expandido e seguir adiante. Esse é mais ou menos o mantra seguido por Marcelo Ferraz, proprietário da rede de restaurantes Wraps.
Foi isso que ele fez. Sem capital, o empresário deu um passo atrás em seu sonho de ser dono do próprio nariz e voltou a ser funcionário. "Nesse momento a racionalidade é fundamental. Eu separava os problemas, os categorizava e resolvia um de cada vez", diz. "Além disso, tinha plena consciência de minha capacidade técnica para sair daquele buraco".
A tempestade começou a ceder quando ele assumiu o posto de vice-presidente de estratégia e novos negócios da editora Abril. O cargo era desafiador e ele poderia exercer todo seu empreendedorismo dentro da companhia. Mas os ataques de 11 de setembro de 2001 derrubaram as torres gêmeas, solaparam a economia mundial e cortaram as asas de Ferraz. Sem poder colocar em prática seus projetos, sua atuação tornara-se burocrática com foco em redução de custos. Frustração. Ferraz tem orgulho de sua história. Diz que aguentou todos esses trancos por ter uma grande capacidade de autoconhecimento. Faz análise desde os 13 anos. Talvez por isso mesmo, hoje não toma mais tantos riscos. É pai. Tem 42 anos. "Toda queda é dolorosa. O que muda é seu poder de recuperação e sua disposição para suportar a pressão. Hoje sou mais receoso e cauteloso do que há dez anos", afirma, com a tarimba de quem sabe exatamente a dor e a importância de cada tombo tomado. |
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